pensando sobre o leite derramado
Essa expressão “chorando sobre o leite derramado” consegue trazer uma tradução tão verdadeira do desperdício que vou usar como a grande analogia desse pensamento.
Vamos considerar que o leite é algo tão importante e valioso que você não pode viver sem, no entanto, ele é um leite mágico. Quanto mais você usa, mais você tem pra usar. E você escolhe as melhores receitas, e inventa medidas, e usa todo o leite nas receitas que merecem nota no seu caderno.
Suas receitas com leite vão do café da manhã de todo dia, ao almoço de domingo com a família, quando você faz a maior questão de mostrar que você usou o melhor leite, pra fazer o melhor prato. Ah, e aquela sobremesa inesquecível que tem gosto de saudade também leva leite do começo ao fim. Faz milagre esse leite, tanto que as vezes basta servir puro e fresco, que ele alimenta e deixa a gente saudável e corado.
E você está sempre escolhendo o melhor lote do seu leite pra servir, todos os dias. Mas, claro, que você também vive experimentando das recitas com leite das outras pessoas. Aquela que passa de geração em geração na família, aquela que é sucesso entre os amigos e aquela que em casa à dois, nossa, é a melhor receita de todas. Mas o problema está quando você começa a servir seu melhor leite, mas o que você recebe está vindo talhado, já perto de azedar.
Na boa, tem coisa pior de chegar perto do que leite azedo? Ele estraga qualquer receita. Imagina você lá com todos os ingredientes prontos e separados pra sua receita do dia, aí na hora de colocar o leite ele tá azedo. Eca. Que nojo. Aí você perde a receita e precisa botar a maior força pra fazer tudo desde o começo, e colocar por sua conta o leite que você sabe que é fresco e perfeito. Aí não tem bolo que desande.
O problema é que uma gota de leite azedo no seu tonel de leite fresco estraga tudo. Não tem jeito. Não tem como tirar, não tem como separar. Já era. Azedou tudo. Não tem segredo mágico que dê certo. Há quem brigue por valer a pena ir até outra fazenda distante pra pegar leite fresco e trazer nas costas pra garantir a receita do dia. Mas o tonel, por mais que você limpe, vai ter resto de leite azedo, o que faz todo o seu esforço ser jogado por água abaixo, mais cedo ou mais tarde. O pior é quando você só percebe o estrago quando vai com toda sede num gole, e o leite já tá mais azedo que tudo no mundo. Eita frustração…
Aí o que você faz? Chora. Em cima do leite derramado, do leite que azedou e das receitas que você não vai mais fazer. E de que adianta? Nada. O tempo que você perde tempo chorando por esse leite derramado, podia estar usando pra ir conseguir leite fresco em outro lugar. Mas lembre-se sempre: troque o tonel antes de trazer o leite novo. Só assim suas receitas podem voltar a andar.
Mas pra gente parar de chorar em cima desse leite azedo não pode ser com carinho, porque carinho conforta e faz você ficar ali, olhando para o tonel de leite e pensando se você não é capaz de criar uma fórmula mágica pra salvar aquilo tudo. O que a gente precisa é de um belo tapa na cara, pra afundar a fuça no leite azedo a tal ponto de ter nojo, ânsia, e sair correndo pra se limpar até que não sobre uma gota.
Só assim o caminho fica livre pra gente ir buscar um leite fresco num novo tonel, numa fazenda distante de onde nem o cheiro do leite podre possa chegar.
Entendeu?
Não?
Então troque leite por amor e veja que nenhum desperdício de chorar pelo que já azedou vale a pena. :)